Como outras civilizações da Antiguidade, Roma criou seu próprio sistema numérico. Apesar de atingirem, em poucos séculos, um elevado nível técnico consequente das conquistas territoriais e aprendizado com os colonizados, os romanos desenvolveram um sistema complexo e pouco operacional.
Os números romanos, apesar de todas as dificuldades operatórias apresentadas, foram atualizados e perduraram durante todo o Império Romano, na Idade Média e Idade Moderna.
Situada na Itália, Roma foi responsável por inscrições numéricas em prédios, muros e lápides há 2200 anos. Em sua numeração, eram utilizadas letras maiúsculas da língua nativa, o latim, difundidas e adotadas por muitos povos da região imperial.
Os antigos usavam um sistema de numeração com acentuadas diferenças do que se vê atualmente. A metodologia do recente modelo é resultado de um longo processo de evolução. Somente a partir do período histórico, conhecido como Renascimento, os números romanos passaram a se apresentar com a notação de valores semelhante ao que é usado no presente.
As letras usadas para simbolizar as quantidades eram: I (1), V (5), X (10), L (50), C (100), D (500), M (1000) – o numeral 0 (zero) não tinha nenhuma representação, sendo posteriormente introduzida pelos árabes. Esses símbolos, facilmente identificados na atualidade, são resultados da transformação de outros mais antigos.
Os matemáticos historiadores comprovam a variedade da numeração romana ao longo dos séculos, por meio de uma antiga foto chamada Columna Rostrata de Duilius. Esse documento retrata um monumento construído em 260 a.C, para comemorar a vitória naval do Cônsul Duilius sobre os cartagineses. Encontra-se nela vestígios de uma representação escrita de extensos números romanos como o algarismo (((I))), presente 23 vezes no trecho mais importante da obra, indicando o numeral 100.000. Isto exemplifica as diferentes lógicas adotadas no modo de se representar um número em algarismos romanos com o passar dos tempos. Essa obra é uma das atrações turísticas do Palazzo dei Conservatori, localizado na Colina do Capitolium, museu italiano.
As comparações feitas entre o antigo e atual sistemas estão relacionadas às diferenças nos algarismos, o raro uso do princípio subtrativo pelos romanos, e ausência de regras que predeterminassem a escritura fixa dos numerais.
As dificuldades encontradas ao se representar números grandes implicou em mudanças sofridas pelo sistema numérico romano. O processo evolutivo passou por três etapas:
Sistema romano-moderno – presente nas instituições, documentos e situações da atualidade.
De provável origem etrusca (povos antecedentes dos romanos), o sistema romano-romano inverteu o sentido da escrita dos algarismos de “da esquerda para a direita” para “ da direita para a esquerda”, tendo como base o 5 e o 10 como método para a combinação de unidades, dezenas, centenas, milhares, dezena de milhares e centena de milhares.
Entretanto, opostos à parte mais aristocrata da população, o povo romano, por não ter nenhuma instrução, preferiu usar os símbolos por serem mais fáceis de desenhar ou rabiscar. Como consequência disso, surgiu uma enorme variedade na forma dos algarismos e nas regras de sua escrita.
Relíquias como a Columna Rostrata (antigo monumento romano) são raramente encontradas. Mas, apesar disso ser consequência das invasões bárbaras e do latim ser usado apenas em Roma nos tempos da República, pois o restante dos domínios adotava dialetos antigos como o etrusco, percebeu-se o aumento do poder romano e da quantidade de registros epigráficos. Alguns deles encontram-se em lápides de sepulturas, inscrições de números na identificação de edifícios residenciais ou públicos, etiquetas e etc.
O Corpus Inscriptionum Latinarum, vasta coleção com mais de 40.000 inscrições registradas por especialistas em história da Roma Antiga, constata facilmente a existência de divergências entre o sistema antigo e o atual, referindo-se ao aspecto dos algarismos e das regras usadas para a escritura dos numerais.
Nota-se, pela tabela, que a partir do número 500, os algarismos eram completamente distintos dos que são empregados no sistema romano-moderno. O uso do M para representar o numeral 1000 era desconhecido, e algo apenas semelhante à letra D representava o 500.
Outros exemplos que seriam considerados absurdos na estrutura do sistema romano moderno, como a presença dos seguintes algarismos: VIIII e IIXX para os números 9 e 18, respectivamente, eram bastante comuns na Roma Antiga.
A partir da queda do Império Romano, a destruição causada por sucessivas invasões na Europa mergulha a sociedade em profundo caos e ignorância generalizada relacionada aos saberes científicos. Porém, no séc. IX, Carlos Magno cria o sistema de ensino, evocando o Renascimento Científico no séc. XII e ressuscita a escrita e as atividades matemáticas.
Alguns poucos conhecimentos da cultura Greco-romana sobreviveram às invasões. Entre eles estavam o sistema romano e as técnicas de cálculo com o ábaco. O isolamento intelectual sofrido durante os séculos fez com que o sistema passasse por inúmeras modificações: deturpações caligráficas dos algarismos tradicionais, introdução de novos símbolos para a representação destes, e uma gama vasta de variação nas regras de escritura dos numerais. Os livros de aritmética do séc. XVI, como “O misticismo dos números de Bongo” por David Smith, ilustram a dialética.
A variedade dos algarismos na Idade Média tornou a linguagem simbólica um tanto confusa, tornando inviável a representação apropriada para esse sistema. Além dos símbolos romanos, os medievais adotavam letras minúsculas e vários outros símbolos somente encontrados no período medieval.
O surgimento da imprensa possibilita uma padronização no sistema de numeração romano. Esse procedimento dura até os dias de hoje.
São inúmeros os vestígios deixados ao longo dos tempos pelas civilizações. A romana contribuiu com os números romanos e, mesmo perdendo parcialmente a utilidade, continuam a ser utilizados nos seguintes exemplos:
Caracterizado pela repetição de um mesmo símbolo em até 4 vezes, o processo aditivo era bastante usado no sistema romano mais arcaico. Modificado posteriormente, esse procedimento foi trocado pelo princípio subtrativo, ou seja, um mesmo símbolo, exceto V, L e D, pode ser repetido até 3 vezes, facilitando a representação.
Uma outra maneira de simplificar a representação de números grandes como o vinte mil (20 vezes a letra M), é indicado inserir um traço na horizontal sobre um numeral simples e fazer a multiplicação entre eles.
M = 1000
MM = 2000
MMM = 3000
MMMM (método antigo) = 4000
__
IV (método atualizado) = 4000
Curiosidade: Vários relógios antigos apresentam o número 4 grafado na forma arcaica IIII, mesmo o sistema romano tendo se modificado. Alguns relatos explicam esse fato por razões estéticas, mas principalmente religiosas. Antigamente, as letras I e V representavam J e U, respectivamente. Júpiter era o deus dos povos antigos, então, para seu nome não ser pronunciado em vão, pois a representação era IVPITER, evitava-se o uso dessas duas letras (I e V) no relógio. Portanto, era preferível a escrita IIII.
Os romanos aproveitaram as próprias letras do alfabeto para representar os números.
Tabela dos Sete Números Chave
A combinação destes símbolos formava o seu sistema de numeração. Cada qual com o seu valor.
Com exceção de V, L e D, os outros numerais podem ser repetidos em até 3 vezes:
III = 3
XXX = 30
CCC = 300
MMM = 3000
V, L e D não podem ser duplicados, pois outras letras (X, C e M) representam esse valor:
V = 5 e X = 10
L = 50 e C = 100
D= 500 e M = 1000
Ao aparecer vários símbolos iguais juntos, somam-se seus valores:
II = 1 + 1 = 2
XX = 10 + 10 = 20
XXX = 10 + 10 + 10 = 30
Agora, se juntos aparecem dois símbolos desiguais, e o menor vindo antes do maior, subtraem-se seus valores:
IV = 5 – 1 = 4
IX = 10 – 1 = 9
XC = 100 – 10 = 90
Caso o menor venha precedido do maior, somam-se os seus valores:
VI = 5 + 1 = 6
XXV = 20 + 5 = 25
XXXVI = 30 + 5 + 1 = 36
LX = 50 + 10 = 60
Se entre duas cifras quaisquer existe outra menor, o valor desta pertencerá a letra seguinte a ela:
XIX = 19
LIV = 54
CXXIX = 129
As letras I, X e C (1, 10 e 100, respectivamente) são sempre colocadas à esquerda de outra de maior valor para representar a diferença delas, obedecendo às seguintes regras:
I coloca-se à esquerda de V ou X
X coloca-se à esquerda de L ou C
C coloca-se à esquerda de D ou M
Os milhares são representados da seguinte maneira:
M é igual a 1000, MM é igual a 2000 e MMM é igual a 3000. Mas, os números maiores que 4000 não são representados desta maneira, pois os algarismos não devem ser repetidos mais de 3 vezes, de acordo com o método subtrativo.
No caso, é utilizado um traço horizontal sobre as letras que representam os números, multiplicando-se o valor 1000 atribuído ao traço, pelo valor simbólico da letra. Por exemplo:
__
IV = 4000
__
V = 5000
___
VIII = 8000
__
IX = 9000
No caso de 1000000 (um milhão), são colocados dois traços sobre a letra.
==
IV = 4000000
==
V = 5000000
===
VIII = 8000000
==
IX = 9000000
Na leitura de números extensos, analisa-se o símbolo de maior valor, subtrai-se o que estiver à sua esquerda, e soma-se aos outros valores que estiverem à direita.
XCVI = C, 100 (maior valor) – X, 10 (menor valor à esquerda) + V + I (outros valores à direita)
(100 – 10) + 5 + 1 = 90 + 5 +1 = 96
Como o sistema numérico romano era uma linguagem intensamente complexa, os cálculos com esses símbolos não fugiriam à regra. Subtrair e somar números com múltiplos dígitos como MMMCMXCIX (3999) era uma tarefa difícil para a época. Multiplicar e dividir, pior ainda.
Os romanos não arriscavam realizar essas operações baseados na escrita romana; portanto, utilizavam outros meios: os ábacos. Esse instrumento auxiliava outras civilizações além da romana, e consistia em uma mesinha onde se desenhavam linhas que representassem ordens numéricas, movimentando fichas, que dependendo da posição do tabuleiro, indicavam determinados valores.
O desenvolvimento dos povos antigos trouxe consigo uma necessidade de realizar maiores operações a fim de solucionar alguns problemas do cotidiano. Contudo, o sistema romano de numeração não atendia todas as exigências e, apesar de se estabelecer na Itália até o séc. XVIII e persistir na Europa até o XVI, caiu em desuso e implicou no surgimento de novos sistemas que tornassem os cálculos mais simples.
Segundo Hélio Consolaro, jornalista, professor, escritor brasileiro e coordenador do site “Por trás das letras”, os números romanos caíram em desuso na atualidade. As escolas não ensinam mais a sua leitura, pois no mundo informatizado não há cobrança ou espaço para esse tipo de escrita. Até os relógios não digitais deixaram de ser fabricados com os famosos marcadores.
O professor ainda lembra que o Manual do Estadão recomenda o uso dos números romanos apenas em nomes de reis, papas e nas transcrições de leis: “Parágrafo 4º – IV – a inelegibilidade de que trata esse parágrafo...”. Nos demais casos, como séculos, capítulos, guerras, governos, planos, projetos, usinas, naves espaciais, zonas, distritos, regiões, festas, feiras, congressos, conferências, simpósios e competições esportivas, passou-se a utilizar os algarismos arábicos.